sábado, fevereiro 12, 2011

Municípios e corrupção política

*ROBERTO ROMANO - O Estado de S.Paulo
Todo ano os jornais noticiam marchas de prefeitos rumo a Brasília para exigirem recursos. Os mesmos periódicos trazem respostas evasivas ou demagógicas do poder central. E como resultado temos as notícias de corrupção, cujos focos passam pelos municípios. Estes, se olharmos bem, constituem o começo e o fim do imenso assalto ao erário. Mas a ausência de uma Federação verdadeira é o que gera os assaltos de políticos e seus comparsas na vida civil.
É difícil entender o que se passa hoje sem revisar a história das instituições que herdamos do passado.
Munícipes, na Antiguidade, eram os habitantes itálicos que tinham direitos de gestão própria, assimilados aos romanos. Quando sem aquela autonomia, as cidades tinham o nome de praefecturae e seus habitantes não perdiam a qualidade de cidadãos de Roma, mas deviam obediência ao Senado de Roma.
Existiram municípios em toda a Europa até a queda do Império Romano. A federação que ligava as urbes a Roma as diferenciava em várias categorias. As mais autônomas, os municípios, concluíam um foedus aequum com a cidade dominante. Essa marca perdurou até a queda do império. O município e sua autonomia eram, ao mesmo tempo, base econômica e obstáculo na edificação do Estado absolutista. As cidades, ameaçadas pela nobreza e pelo clero, sofriam o assédio dos papas e monarcas que tentavam centralizar nações. Essa situação continuou até o século 18.
A liberdade municipal, segundo Alexis de Tocqueville, sobreviveu ao feudalismo. Em nações como a alemã e a italiana, as cidades chegaram a formar pequenos Estados. As Cortes da França, da Espanha e de países menos estratégicos, como Portugal, sufocaram as cidades ao impor sua burocracia, com a "igualdade" de todos diante do rei. No século 18 o governo municipal degenerou em oligarquia, "algumas famílias conduziam nele os negócios, tendo em vista fins particulares, longe do olhar público e sem serem responsáveis diante dele: trata-se de uma doença espraiada por toda a França" (O Antigo Regime e a Revolução). O poder régio domou as urbes, tornando-as centros corruptos e venais. A burocracia sufocou a independência dos municípios.
Passemos ao Brasil.
Aqui, a história política mostra similaridade com a descrita por Tocqueville. Uma agravante: nossas cidades já apareceram sob o absolutismo, não viveram a autonomia romana nem lutaram para manter suas prerrogativas na Idade Média. Não ocorreram nelas eleições livres nem a responsabilidade dos governantes diante dos munícipes. Terra de conquista, sobretudo econômica, o Brasil foi administrado segundo a moderna "igualdade de todos sob o rei".
Boa parte dos ofícios públicos era vendida ou alocada segundo os interesses da Corte. Em imenso território, as cidades eram geridas a distância. Os impostos seguiam para Lisboa, com pouquíssimo retorno à origem. A tendência centralizadora do poder consolidou-se em Portugal nas reformas pombalinas. Com a vinda da Casa Real se compôs a Corte no Rio de Janeiro, onde se integravam a nobreza, burocratas de alto escalão, serviçais e negociantes. O "povo" era a aristocracia, composta pelos "homens bons" sem sangue judeu. A representação "popular" fazia-se por petições, dando-se o direito de voto sem que os cidadãos tivessem presença ativa na esfera pública.
A grandeza do território, as revoltas, o exemplo dos países vizinhos que se tornaram Repúblicas, a memória da Revolução Francesa, todo um amálgama de pavores cortesãos definiu nosso Estado desde o nascimento. Surgiram dois projetos conflitantes: o da monarquia soberana e o de um governo constitucional. Venceu o primeiro, o império civil foi instituído por direito divino. A Constituição de 1824 incorporou o quarto Poder e o ampliou, pois ele podia dissolver a Câmara de Deputados, afastar juízes suspeitos, etc. A preeminência do Poder Moderador sobre os demais foi mantida mesmo nos tempos de Regência. Na República, tais prerrogativas foram mantidas para o chefe do Estado. Com elas veio a pretensão dos presidentes de supremacia sobre os demais Poderes.
O nosso Estado é um arremedo de República, sem harmonia entre os Poderes, sem federalismo. Ele é império, sob o Executivo central. Se no Brasil foedus significasse um "pacto", teríamos graus crescentes de autonomia, dos municípios ao poder de Brasília. Mas nossas leis desconhecem diferenças regionais e culturais, de geografia, etc. Uma uniformidade gigantesca obriga todos a seguirem a burocracia do Executivo. Não existe tempo nem autoridade para o experimento e modificações das políticas públicas em plano particularizado.
As "tragédias" das enchentes mostram o desastre desse centralismo. Não temos uma escala real de responsabilização pelas políticas públicas. Todas as decisões são açambarcadas pelos que habitam os palácios brasilienses. Logo, as oligarquias parasitam os Poderes (a mais célebre mantém este jornal sob censura) e mostram face dupla: trazem os planos do poder central (e recursos) aos Estados e levam ao Planalto as aspirações regionais.
As tratativas entre os dois níveis (central e estadual) ocorrem no Congresso Nacional. Ali, Presidência e Ministérios buscam apoio para os seus projetos. É impossível conseguir verbas sem "favores", mercadejo dos cargos, pró-labore "informal" por "serviços prestados".
Enquanto não existirem municípios autônomos, sobretudo nas finanças, testemunharemos: uma das fontes mais poluídas de nossa política corrupta é institucional.
Federação de fato, já!
*FILÓSOFO, PROFESSOR DE ÉTICA E FILOSOFIA NA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS (UNICAMP), É AUTOR, ENTRE OUTROS LIVROS, DE ''O CALDEIRÃO DE MEDEIA'' (PERSPECTIVA) 

OPERÁRIOS DO NADA

As inúmeras câmaras de vereadores no Brasil refletem a grandeza da nossa inexpressividade política. Do nosso nada. Não somos politicamente expressivos, somos meio-cidadãos em participação. Isso possibilita que milhares de vereadores sejam puros operários do nada. Portanto, isso tem nossa parcela de culpa.


Os gastos com esses indivíduos são volumosos e compõe a carga tributária que arrastamos. Com a multiplicação irresponsável de municípios, os custos só aumentam e os resultados são cada vez mais pífios, com sucessivos escândalos de desvios de recursos públicos.  Em nada melhoram as condições de vida dos cidadãos. Será justo sustentar por quatro anos um inútil, de nada fazer e de nada significar para o bem comum?


Os gastos são altos com um único vereador, particularmente se comparados aos resultados produzidos em prol do interesse público e em defesa da coisa pública. Há uma enorme diferença entre custo e benefício.

Cidades de 10 mil eleitores com 09 vagas de vereador é um desperdício de recursos públicos. Um parlamentar municipal, em geral, serve para servir ao executivo ou para fazer “oposição” a esse.

Ambas as atitudes têm sido de baixíssima qualidade: a primeira, por ser vergonhosamente servil, além de distorcida e irresponsável. A segunda, na maioria dos casos, é mero casuísmo, não consegue ser propositiva e vive exclusivamente de denúncias derivadas da investigação da imprensa. Quando não há escândalos, não fazem nada. Cabe rever a competência parlamentar do vereador.

Reforma política séria diminuiria o número de vereadores. Nas cidades com menos de 40 mil eleitores não deveria ter mais de sete vereadores. As cidades com menos de 10 mil eleitores deveria ter, no máximo, cinco vereadores e não deveria ter remuneração pelo exercício do cargo. Os mandatos seriam pelo desejo de servir à coletividade, um verdadeiro servir público.

Todo parlamentar deveria ser obrigado, por lei, a fazer prestação de contas. Apresentar, no final do mandato, um relatório de suas atividades. Os que tivessem menos de 60% de participação/presença ficariam inelegíveis e sem direito a recurso.

O senhor Pereirinha, presidente da Câmara Municipal de São Luís, o sexagenário – assim estava escrito nas camisetas distribuídas no seu aniversário -  teve empenho total para
Exigir do IBGE que apresentasse a população de São Luís com mais de 01 milhão de habitantes, o famoso golpe do milhão. Para quê? Para aumentar o número de vagas na Câmara Municipal.


Qual o empenho da Câmara para cobrar maior empenho do prefeito? O que estão fazendo contra esse descaso em que se encontra São Luís?

 SEM PROPOSTAS - ELEIÇÃO PRESIDENCIAL 2022 O que tem movido os eleitores brasileiro diante das candidaturas à presidência da República este ...