Os últimos dois dias se confirmou o óbvio: o Legislativo brasileiro não tem compromisso com a opinião pública. As reivindicações públicas, que surgiram a partir das manifestações de junho de 2013, não foram respeitadas em nada e,em especial, a Reforma Política.
Na verdade, em nenhum momento existiu um projeto de reforma política, pois nenhum projeto apresentado compreendia como reforma política como reforma do Estado como um todo. Só assim poderíamos dizer que se tratava realmente de reforma política.
Os projetos apresentados como novidades não traziam nada de novo e nem de melhor que tantos outros projetos apresentados ao longo dos anos e que estão dormitando por mais de 15 anos nas gavetas sem nunca terem ido a votação. Essa mise en scène, no entanto, alimenta todos os conservadores, todos os beneficiados pelo sistema que aí está. O PT ganha com a manutenção e tenta ressalta a derrota de Cunha para ocultar sua predileção pelo atual sistema eleitoral. O PSDB também não tem proposta nenhuma de reforma e estava esperando para ver com se sair melhor. Uma mudança significativa no sistema eleitoral e partidário nenhum dos grandes partidos querem. A defesa do PT de lista fechada, e o PT só quer isso, é tão incompleta e obscura quanto a proposta de Cunha. Quem leu o livro Reforma Política e Cidadania (2003), já constatou que o PT no poder não teve nenhuma vontade e compromisso político com a Reforma Política. O PT está fazendo uma encenação.
A proposta do Cunha é horrível, falha e intencionalmente elaborada para não ser aceita. Ela mais serviu para obscurecer mais o que são sistemas eleitorais e sistemas de partido. Primeiro, não se estava criando distrito algum, porque cada estado membro já representa uma territorialidade do voto e a extensão da representação. O que estava em votação era a mudança de sistema proporcional. Distrito aparece como sinônimo de eleição majoritária e como se em sistema de distrito só se pudesse votar dessa forma. Não só isso, não existe detalhamento sobre a contagem dos votos e o critério da vitória (se no tudo ou nada ou se no escalonamento, quem chegar na frente) e se seria na forma uninominal ou plurinominal. Isto é, faltou propositalmente pensar as questões em torno de maiorias conjugada com pluralidade na composição da representação parlamentar.
O pior é ver que o sistema vai continuar do mesmo jeito. Proporcionalidade com coeficiente eleitoral e utilizando a fórmula de D'Hondt já provou ser uma bizarrice de produzir sub-representação e sobre-representação. Representantes de coisa alguma, eleitos restritos a molecularidade da clientela eleitoral mantida pela compra continuada do voto, chefes de interesses exclusivamente privados mantidos pelo abuso do poder econômico.
Minimamente deveriam ter se retirado o quociente eleitoral com linha de corte. Seria menos danosa a proporcionalidade utilizando somente a fórmula de D'Hondt.
A criação do distrito (mais um) verdadeiramente seria uma unidade territorial do voto acima da territorialidade municipal e abaixo da estadual. A vantagem seria privilegiar as lideranças dessas regiões e banimento dos parlamentares paraquedistas (sem vínculo com a região que só aparece para pegar o voto).
Essa irresponsabilidade do Legislativo, comungada pelos grandes partidos, é um passe a mais para a deslegitimação do Parlamento e da Política. O perigo consiste no fato que depois da política só sobra a violência e sem nenhum pressuposto. Cada vez mais as pessoas estão desinteressadas pela política e percebem sua exclusão dessa esfera: sem terem seus direitos reconhecidos e respeitados, sem serem ouvidas, sem terem chance de interferir no processo decisório. Aí pode aparecer as inúmeras seduções da barbárie. Esse enterro da reforma política é um ato de extrema irresponsabilidade diante do momento.
O PT à frente do poder foi um dos piores acontecimento da vida republicana. Primeiro, porque efetivou as práticas mais anti-republicanas registradas desde a Proclamação da República até hoje. Segundo, porque o país ficou sem oposição. Principalmente a oposição com vínculo orgânico com os diversos setores da sociedade civil organizada. Mas isso só vira um problema sério quando é processado um verdadeiro engessamento dos sindicatos e movimentos sociais pelo governo federal. O que tem produzido diversos níveis de sedução da barbárie: uma anti-política em escala nacional.
Agora só a mobilização e a determinação cívica parecem ser o recurso de fortalecimento da Política e correção das instituições. Só resta a força popular avassaladora como recurso.
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