Quem é povo? Ou o que é o povo? Não sou
desconhecedor das definições e dos sentidos clássicos dados ao conceito. Falo o que é povo eleitoral, o
que elege um dado candidato em certas circunstâncias.
Vejamos. Quinta-feira passada fui
ao Banco do Brasil levar uns documentos, como sempre, aquela dificuldade para achar
uma vaga no estacionamento. Depois de achar a vaga fui fazer o que tinha que
fazer. Quando retornei encontrei, próximo a meu carro, um senhor com um crachá dependurado
no pescoço, era o flanelinha. Ok. Liguei o carro, manobrei e quando fui entregar
meu 01 real ao senhor e lhe fiz a seguinte pergunta: E as eleições? Quem ganha?
Ele prontamente me disse: “É ..... (fulano)”. Argumentei sobre as deficiências
já apresentadas pelo candidato. Respondeu aos meus argumentos da seguinte
maneira: “ Não sabe que povo gosta de se iludir?”.
Pois bem, quem é esse povo? Pelo
que pude perceber, esse cidadão afirmou quem vai vencer (na forma de uma
propaganda), mas não quis assumir que prefere o candidato que citou. Será que
ele estava chamando a si próprio de ‘povo que gosta de se iludir’? Ou é o
preconceito de assumir sua opção? Assim como o brasileiro tem preconceito de
ter preconceito, alguns eleitores teriam preconceito da sua opção política? Alguns
teriam preconceito de serem conservadores?
Mas o caminho pode ser outro. Ou
esse “povo que gosta de se iludir” é uma forma irônica de responder à violência
como é tratada socialmente a vontade política dos setores pobres da população? Significativa
parcela das classes médias culpam os pobres pela eleição dos maus políticos. Existe,
entre nós, uma violência generalizadora que afirma que os pobres e analfabetos
não sabem votar. Como se eles fossem despossuídos de todo e qualquer
discernimento, consciência e percepção das coisas.
A questão não é só ter ou não
consciência, mas também uma questão de opção. Passa pelo direito que cada um deve ter de poder optar. Quem opta diferente de nossas preferências não tem consciência? Grande parte do eleitorado não sofre de
falta-de-consciência, mas de liberdade. É uma questão também de opressão, não só de
consciência. Quem não é livre não escolhe. Eu não vejo sentindo culpar a vítima
por tal crime. A outra parte dessa violência é achar que todo pobre é venal,
que vende seu voto por qualquer coisa. Por isso, muitos têm uma crença cega no
poder da “máquina” e na certeza da vitória de quem está no poder.
Essa história tem outro lado.
Assim com ouvi o flanelinha, ouço, quase diariamente, as vozes dos setores
intelectualizados. Aí tem uma coisa assustadora e sem crítica. O que é isso? A
unanimidade em torno da ida de Castelo para o segundo turno. Ninguém em nenhum
momento levantou a voz e exerceu acrítica para dizer que: se ele for para o
segundo turno não é confirmação dessa “verdade”, mas a constatação que essa
forma de publicidade funcionou.
Fico pasmo como alguns opositores
do ocupante do governo não se dão conta que são os maiores marqueteiros dele.
Se o ocupante do governo for para o segundo turno ainda vão comemorar o seu acerto.
Se isso ocorrer o acerto será do ocupante do governo, que soube fazer a sua
propaganda ao ponto de tornar uma inverdade em fato, utilizando-se dos
opositores. A fórmula é repetir a mentira até que todos passem a considerar como
verdade.
Quem é mesmo o povo que gosta de
se iludir? O que fazem as classes médias?, como elas aderem a uma candidatura?,
elas são sempre racionais, críticas, conscientes na escolha eleitoral? Que
consciência é essa?
Ora, nem sempre a de vontade/intenção
de votar na pessoa X é concretizada. As pessoas podem mudar de ideia, as
pessoas podem esquecer-se de fazer o que diziam que iam fazer e muitos não são
suficientemente livres para escolher, seja qual for o fundamento dessa
não-liberdade. Persiste então a pergunta: quem é esse povo que vota em Fulano?
Lembrando que Fulano é campeão em rejeição e desaprovação, com índices altos. A
certeza da ida de Fulano para o segundo turno e de sua vitória não é só mito?
Ou sua principal arma de propaganda eleitoral? Outubro... saberemos!