Vincent van Gohg - Ramos com flores de amêndoa. |
O
Brasil é membro de um seleto grupo de países que tem feriado nacional
relacionado diretamente com os mortos ou com a morte.
- Comecei a visitar o cemitério em um dia de Finados ainda na tenra idade. Nessa época, o começo, tudo girava em torno da luminosidade das velas. O espetáculo das chamas. O brilho das luzes das velas era o atrativo maior para a criança que eu era.
- Eu ficava rodeando a sepultura de minha tia (a Luísa, que não cheguei a conhecer) no esforço de manter as velas acesas. Além do “ofício” de fazer bolinhas da cera derretida. A morte não era nenhuma questão para mim. Só tempos depois veio o medo de almas, das visagens, mas até aí a morte não era uma questão séria, nem relevante. Não tinha nenhum efeito. A morte só se tornou uma questão séria quando minha avó materna morreu (Adosinda). A morte passou a ser algo e de forma significativa: perda.
- O tempo passou, e muito passou. Questões outras apareceram e adquiri novas formas de pensar o drama da vida e da morte. O medo de visagens e de almas despareceu. Daquele tempo só permaneceu o fascínio pelo brilho das chamas.
O
feriado de Finados só pode ter sentido para quem, no mínimo, é espiritualista.
Isto é, acredita na existência de espíritos, que algo transcende ao arranjo
físico do corpo. Por outro lado, é bom frisar, alguns espiritualistas não veem utilidade no
feriado e nem no ato de visitar os túmulos, pois tais atitudes seriam desnecessárias. Defendem que os
mortos podem ser lembrados de qualquer lugar, em qualquer dia e não estariam
fixos ou presos nos túmulos. Defendem que os mortos não permanecem mortos, mas vivos em uma nova forma de vida. Nessa visão os espíritos ficam Livres dos corpos, e tomariam rumos
diferenciados. Existem inúmeras concepções e doutrina sobre a vida pós-morte e as condições do espírito.
Sendo
ou não espiritualista, acreditando ou não na transcendência do espírito, o
feriado de Finados traz uma questão comum a todos: vida e morte.
A morte é o elemento que iguala a todos. Todos nós, qualquer um morre.
Não existe morte diferenciada, simplesmente se morre. Pode haver diferenças nos funerais e nos processos que culminam com a morte, mas a morte em si é igual e para todos.
A morte é o elemento que iguala a todos. Todos nós, qualquer um morre.
Não existe morte diferenciada, simplesmente se morre. Pode haver diferenças nos funerais e nos processos que culminam com a morte, mas a morte em si é igual e para todos.
Morte
é morte, nem bela, nem feia. Não tem meia-morte. Não pensar na morte não nos
tira do dilema da morte, pois isso não nos faz imortais e tão pouco nos isenta
do que todos passam no momento morte. O dilema do desconhecido persiste mesmo diante do esforço da indiferença.
Vincent
van Gohg, depois de atirar contra si, passou dias agonizando sobre uma cama e, nesses
dias finais, fez alguns pronunciamentos aos que lhe assistiam. Dentre os pronunciamentos disse: “A desgraça dura para sempre.” Vincent parece ter percebido, antes de
morrer, que a morte não encerrava tudo.
O
feriado de Finados é uma deferência, antes de tudo, aos dramas e dilemas dos
vivos, dos que ainda não morreram. A morte só é um problema para quem está
vivo. Pois são eles que estão presos a duas questões não transferíveis: ter que
morrer um dia e os sentimentos de dor/perda diante da morte dos outros.
Como
a morte é uma certeza, um determinismo, toda a morte e a morte de cada um acaba
sendo um drama pessoal de todos. Cada um que morre põe em destaque a certeza da
nossa própria morte, diz sobre nosso fim, nesse tipo de existência.
O
feriado de Finados homenageia os dilemas dos vivos diante de um determinismo:
morrer.
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