quinta-feira, julho 28, 2016

A praga das eleições a cada dois anos


O sistema eleitoral e partidário brasileiro é hoje um dos fortes componentes  na produção e reprodução dessa crise e corrupção no aparelho de poder. Não foi sem motivo que Eduardo Cunha encenou uma "reforma política" para o deixar exatamente nos moldes que está em todos os seus fundamentos. 

Dentre os diversos problemas e vícios desse sistema eleitoral-partidário temos o calendário eleitoral, que nos coloca eleições a cada dois anos. O problema não são os dois anos em si, mas o que isso provoca. Na prática o aparelho de poder, a rotina administrativas e as verbas públicas ficam de forma quase continuada voltadas para as eleições. Assim, logo que terminam as eleições para prefeitos e vereadores começam as campanhas para deputados federais e estaduais, governadores, senadores e presidente da república. 

Isso cria uma cadeia viciosa que coloca as questões de interesse público e do bem comum em último plano. Basta ver que já estamos discutindo as eleições presidenciais de 2018 sendo que as eleições municipais ainda não ocorreram. Todos os recursos dos governos estaduais vão ser lançados agora para elegerem os prefeitos aliados e potencialmente financiadores e apoiadores nas eleições para governador, senador e presidente da república. Nesse momento posterior os prefeitos jogarão toda a força da máquina municipal em benefício  dos candidatos à eleição ou reeleição ao cargo de governador (o que lhe apoiou na eleição municipal) e, derivadamente, aos candidatos ao cargo de senador e aos cargos de deputados federal e estadual. Os deputados estaduais e federais entram nesse processo de bancar as candidaturas municipais aos cargos de prefeito e vereador, a fim de garantirem apoio nas eleições futuras. Nada demais se não envolvesse comprometimento de recursos públicos e interesses em nada republicanos. Em geral isso produz corrupção, favorecimentos e prejuízo ao interesse público. A lógica partidária/eleitoral no Brasil não reconhece e não respeita limites.   

Quando não é o dinheiro do contribuinte entra os financiamentos criminosos de "empresas" (empreiteiras e construtoras) e de agiotas que investem em campanhas para retirarem o trípolo em obras superfaturadas, mal executadas, com materiais de péssima qualidade, abaixo das especificações. Assim ocorrem as inúmeras: recuperações de escolas, pinturas em prédios, troca da iluminação pública, troca da frota de veículos etc. Além da escancarada indústria do tapa buracos (asfalto/pavimentação) e do sistema de coleta e destinação do lixo. Ou simplesmente os recursos públicos são repassados diretamente para os agiotas através de empresas de fachada, que passam a agir como fornecedoras de materiais, alimentos, medicamentos etc. (a merenda escolar é o prato predileto desse esquema). Outra forma criminosa que já tem seu lugar cativo nos esquemas das campanhas eleitorais é lavagem de dinheiro, onde recursos provenientes dos diversos tipos crimes (assaltos, tráfico etc.) são bem lavados, ficam "limpinhos" nas campanhas.

Ora, de tudo se ocupa para fins eleitorais sem descanso ou pausa em que possa se debater questões fins dos negócios públicos como a saúde, saneamento, emprego, educação, segurança, transporte, lazer etc. As campanhas servem para não ter debate público sobre coisas públicas, são cortinas para desviar a atenção e para alimentar esquemas criminosos, há tempos deixou de ser um dos exercícios do poder de cidadania, soberania popular.   

Necessitamos acabar com essas eleições a cada "dois" (na prática não existe intervalo). Não há nenhum motivo democrático e republicano para mantermos esses calendário danoso e viciado. Uma das mais urgentes reformas é fazer eleições gerais. É óbvio que isso precisa estar acompanhada de outras medidas como a limitação de campanha e a limitação de gastos de campanha etc. 

É preocupante como os governadores, diante de tantos problemas nas unidades federativas e da eterna e lardeada falta de recursos, viram integralmente organizadores e financiadores de campanhas municipais. Eleições gerais já! 












segunda-feira, julho 11, 2016

Memória ética seletiva. Algumas considerações sobre um texto que li...


Memória ética seletiva. Li um texto sobre isso e fiz algumas considerações. Segue: 
A memória para ser memória precisa ser seletiva. Texto faz uma provocação, mas se ancora em uma das coisas mais perversas contra a sociedade brasileira, que é fazer uma crítica aos críticos da corrupção imputando um caráter corrupto à sociedade brasileira. Com o absurdo argumento de que ninguém pode legitimamente criticar, porque todos em maior ou menor escala cometem corrupção. Primeiro erro, esse trato ético desconsidera o contexto ético histórico que compreende as motivações do acatar ou não o valor e qual o grau de importância do mesmo.  Nenhuma realidade ética, fora da mera especulação do pensamento, cumpre o seu status ético sem tensões, conflitos, sem alterar valores e, em boa parte, as mudanças decorrem disso.  Além disso, nunca existiu uma sociedade que todos realizem determinados preceitos ou cumpra a obediência de um valor de forma idêntica. Porém, existe o campo dos atos não aceitos, que correspondem ao que seletivamente foi escolhido para ser repudiado.  No entanto, é cruel e falacioso colocar no nível da corrupção política e da coisa pública desvios da norma que não correspondem à mesma grandeza e gravidade. Isso é como não distinguir crime e contravenção, negligência administrativa de um homicídio. A memória há de ser seletiva porque é necessária. O mais perverso é que querer legitimar os crimes dos poderosos igualando toda a sociedade ao mesmo patamar de delinquência. Isso é uma das piores visões elitistas, porque corresponde a uma visão de que a massa é onde sempre estão os piores costumes e por isso um grupo menor e mais apurado deve conduzir as coisas. O pensamento aristocrático de Platão e Aristóteles residem nisso. Esse texto negligência sob um aspecto fundamental, o espaço público e o que é próprio da política. Também ignora a liberdade própria da democracia e a liberdade liberal. Vejamos. Na democracia todos podem reclamar e emitir opinião independente da sua qualificação, se goza de direito político pode, nada mais importa. E a liberdade consiste em que só os cidadãos podem impor a si uma norma (soberania de deliberar), mas que cada um viva a sua maneira. Na democracia estava divido o que é público e privado. Por isso, é um tanto obscuro tentar julgar o cidadão por atos privados em confrontação com atos de natureza totalmente pública (como é o vaso da corrupção no aparelho de poder do Estado e da administração pública). Do público e para público e todos podem reclamar. Temos também que ver o lado da liberdade Liberal que diz respeito ao fato de não ter impedimento. Também é liberal o fato do indivíduo individualmente ter direito. Ora, o Brasil é uma sociedade profundamente hierarquizada, com distâncias sociais colossais e tal realidade tem componentes e fatores múltiplos de produção e manutenção. Toda vez que um pobre individualmente reclama aquilo que se constitui um direito, o "coletivo" é automaticamente lembrado, mas somente como mecanismo de manutenção da hierarquias e distâncias sociais. Isto é, a defesa do público, do coletivo só é evocada pelos segmentos sociais privilegiados quando isso implica em defender a manutenção de privilégios e/ou como artifícios para assegurar a hierarquização e os elementos simbólicos que necessitam para forjar sua superioridade ou maior qualificação. Se a reivindicação do pobre (que é um direito) significa uma horizontalidade, isonomia e que lhe possa conferir simbolicamente ou materialmente uma igualdade (mesmos atributos e posses), ela é  automaticamente desqualificada de alguma maneira, se não é por falha no ato formal, é por supostas imprecisões e inconsistências, há sempre um estatuto ou uma hermenêutica que possa barrar a pretensão e manter a ordem de privilégios e hierarquia. Os  mesmos artifícios também são usados quando a reivindicação é de um par, de um amigo ou comparsa, mas com efeito diferente e logo esse indivíduo terá seu privilégio perpetuado mesmo que não tenha direito, tenha erros formais, que substantivamente não se sustente e que não passe de um ato de vaidade.  Nesse último caso tudo se pode contra o patrimônio público, jamais tal ato vai ser visto como contra o interesse público e algo egoísta. Se é um pobre, um não igual a coisa muda e automaticamente o direito individual passa a ser irresponsável e egoísta e um direito supostamente coletivo passa a ser enaltecido. A memória é sim seletiva e deve ser. Por isso, os que não são os privilegiados devem ser aguerridos na cobrança e lutar sempre para serem eles os definidores da seletividade ética da memória. Por qual motivo?  Pelo motivo simples e crucial da democracia: ser a maioria.


 SEM PROPOSTAS - ELEIÇÃO PRESIDENCIAL 2022 O que tem movido os eleitores brasileiro diante das candidaturas à presidência da República este ...