domingo, agosto 28, 2011

OPOSIÇÃO PERFEITA E A INÉRCIA


Não foi possível identificar o autor da ilutração
"Era um abutre que me dava grandes bicadas nos pés. Tinha já dilacerado sapatos e meias e penetrava-me a carne. De vez em quando, inquieto, esvoaçava à minha volta e depois regressava à faina.

"O abutre escutara tranquilamente a conversa, fitando-nos alternadamente. Vi então que ele percebera tudo. Elevou-se com um bater de asas e depois, empinando-se para tomar impulso, como um lançador de dardo, enfiou-me o bico até ao mais profundo do meu ser. Ao cair senti, com que alívio, que o abutre se engolfava impiedosamente nos abismos infinitos do meu sangue." (Texto atribuído a Kafka)


Muitos não se dão conta que o perfeito é imóvel: na perfeição não cabe retoque. Assim se põe grande parte da oposição ao mandonismo sarneísta no Maranhão. Nesse mundo divinal da perfeição acaba faltando espaço para se FAZER política: atividade sempre inconclusa e sempre aquém das formulações ideais.

A Política vem, desde a Antiguidade, revelando-se uma das melhores maneiras de responder ao constante fluxo da proliferação das necessidades imperativas da própria vida e da vida social. 
O fazer partidário não esgota o fazer político. Isso piora quando o fazer-partidário da política fica alienado da própria Política e perde as conexões reais para efetivação das mediações de interesses e necessidades. Partido não pode perder de vista os níveis de interesses e apoios para além do seu círculo e tampouco pode se fazer partido legitimado sem que sua formulação particular se apresente em nome do interesse geral e assim seja reconhecido.

O que acontece atualmente. Essa mesma parte da oposição sonha com o falecimento físico do seu principal algoz como a chance de ascender ao controle do poder político. Sonho um tanto quanto declaratório de incompetência que, traduzido, significa: “não consigo te vencer e só alcançarei o poder se você não mais existir”. Pura ingenuidade. Como alguém pode gozar do poder fora de uma relação social? Como esse poder será exercido sem uma outra parte? Isto é, vão "exercer o poder" só quando ninguém mais existir e na total inexistência de forças discordantes. Imaginam equivocadamente.  

O sarneísmo é uma teia extensa e sustentada por conexões profundas com os diversos órgãos/agentes estatais em todos os níveis do poder e da administração pública estatal, empresarial, religiosa etc. Envolvendo entidades classistas e diversas organizações da sociedade civil. 

Nada indica que ocorrerá um sumiço instantâneo do sarneísmo com a morte física do principal ícone desse mandonismo: Sarney.  

Os mandões não estão inertes e tampouco pararam de pensar no amanhã, muito pelo contrário, esse cenário sem o senador Sarney já está sendo trabalhado, pensado em termos de sobrevivência da teia. São muitos os interesses e muitos os interessados. Isto é, tem muita gente que tem o que perder e que não vai ficar parada esperando a “morte” política chegar, tal qual sonha a oposição perfeita.

O que essa oposição quer e para quê? A experiência Jackson no governo do estado deixou o exemplo de que não basta querer, nem só ser contra para mudar a política do Maranhão e livrar o estado desse mandonismo. A superação  do sarneísmo exige muitos outros esforços.

Quais serão os novos gestores em um governo não-sarneísta? Serão novos em quê? O que a novidade tem de novo? Ou será o novo mais do mesmo?

Enquanto a teia já projetou e está articulando sua sobrevivência para os próximos 20 anos, a oposição (perfeita) está quase inerte, só sonhando com a chegada da sorte. As "articulações", até agora, são extremamente marcadas pelo personalismo e por surtos histéricos de vaidades. A situação é tão absurda que derrotados eleitorais ficam disputando, entre si, o título de melhor derrota.

No ambiente da perfeição ninguém sede, porque todos são perfeitos.

O que ocorre de real? Uns vão fazendo individualmente seus acordos dissimulados em prol do seu próprio umbigo e nada mais que isso. É uma pena, mas até agora não tem passado desse patamar. 

Se existisse a capacidade de perceber a imperfeição, a inércia não teria tanto assento e movimentos reais já estariam acontecendo rumo à tomada do poder. O contexto sinaliza que ninguém fará essa tomada de poder sozinho. 

Se não for através de uma unidade mínima a oposição ao sarneísmo não vai realizar a sonhada tomada do poder. Fora isso, resta capitular e estabelecer uma transição conciliada, operando como o príncipe da oxigenação da persistência do atraso, ou ser a vanguarda do atraso e, nesse caso, o novo já vai nascer velho. 

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